domingo, 4 de janeiro de 2015

Mais Médicos e ações na atenção básica são marcas do governo Dilma




4 de janeiro de 2015 - 8h24

Eles foram às ruas de jaleco e nariz de palhaço, fizeram passeatas e mais passeatas, estimularam boicotes e chantagearam o governo – tudo com apoio da mídia tradicional. Mas não adiantou.

Em seu primeiro mandato, Dilma Rousseff enfrentou a resistência feroz e raivosa de entidades de classe como o Conselho Federal de Medicina (CFM) e suas federadas, a Federação Nacional dos Médicos (Fenam) e a Associação Médica Brasileria (AMB), entre dezenas de outras. E levou adiante aquele que talvez tenha sido o que de mais revolucionário seu governo realizou: o programa Mais Médicos.

Provado e aprovado pela maioria da população brasileira assim que os médicos começaram a atender, principalmente por aquela parcela de brasileiros que em pouquíssimas vezes na vida tiveram a oportunidade de consultar um, a ação ganhou respeito. Tanto que os principais candidatos à Presidência da República sequer cogitaram interrompê-lo. Pelo contrário: em suas propostas de governo registradas no Tribunal Superior Eleitoral, chegaram a destacar o nome do programa federal e a prometer ampliá-lo.

Pudera. Uma pesquisa do Ministério da Saúde mostra que 87% deles não tiveram dificuldade de compreender o que os médicos cubanos falavam. Apenas 2% relataram problemas de compreensão, sendo que parte das entrevistas foi feita em aldeias indígenas, onde não se fala português. A maioria dos entrevistados (67%) respondeu que os médicos do programa fazem recomendações sobre alimentação e sobre atividades físicas.

Sem contar reportagens da própria mídia tradicional que chegaram a mostrar depoimentos emocionantes de brasileiros que, finalmente, podiam contar com um médico não só na hora de tratar uma doença como de descobrir antes que se tornasse algo mais grave.

Presente em 3.785 municípios brasileiros e em 34 distritos indígenas, a estratégia beneficia atualmente 50 milhões de brasileiros em localidades distantes e nas periferias das grandes cidades, em localidades em que mais de 20% da população em situação de extrema pobreza, Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) baixo ou muito baixo, além dos municípios localizados no médio e alto Araguaia, no Vale do Ribeira (SP), Vale do Jequitinhonha (MG), Vale do Mucuri (MG) e os distritos indígenas.

Tudo isso só foi possível após a chegada dos 11.429 médicos cubanos, a maioria deles hostilizados já na chegada aos aeroportos brasileiros, por colegas que preferiram ignorar as condições de saúde da população em detrimento de seus interesses corporativos. Dos médicos brasileiros que teriam prioridade na escolha das localidades onde atuar, só 1.846 atenderam ao chamado do Ministério da Saúde, além de outros 1.187 médicos estrangeiros ou brasileiros com diploma de outros países que aderiram ao programa, segundo dados do próprio governo.

O programa que resulta das sucessivas idas de gestores municipais de saúde a Brasília em busca de ajuda para a missão quase impossível de contratar médicos, claro, conta com apoio irrestrito da quase totalidade das prefeituras, inclusive ocupadas por partidos de oposição.

Mas não é só por causa da chegada nos médicos. É porque o programa prevê também a ampliação do número de cursos de medicina. Até agora, o governo federal já selecionou 39 cidades brasileiras para receber os cursos, em 11 estados, que garantirão 2 mil novas vagas. Desde o início do ano tinham sido criadas outras 4.199 vagas. As selecionadas terão a responsabilidade de implementar programas de residência médica, manter a estrutura necessária na rede pública de saúde e fazer as adequações recomendadas para habilitação do novo curso.

Isso para atingir a meta de sair dos atuais 374 mil médicos no país e chegar a 600 mil até 2026, o que garantiria a média de 2,7 profissionais por mil habitantes, semelhante à do Reino Unido.

Atualmente, existem 21.674 vagas de graduação em medicina autorizadas no Brasil. Desse total, 11.269 estão no interior e 10.045 em capitais, como parte da política de interiorização do ensino superior adotada pelo governo federal desde a gestão Lula. Até 2012, predominavam vagas nas capitais, que tinham 8.911, enquanto no interior havia 8.772 vagas disponíveis.

E também porque o Mais Médicos prevê ainda a reestruturação das unidades básicas de saúde no país, para garantir melhor atendimento. Os recursos gerais para a atenção básica aumentaram 106% entre 2010 e 2014, segundo o Ministério da Saúde. No primeiro ano, eram R$ 9,7 bilhões destinados ao atendimento primário, valor que saltou para R$ 20 bilhões neste ano, sem contar o aporte dos estados e municípios.

Parte desse investimento foi direcionada para programas que permitiam melhoria da infraestrutura das unidades básicas de saúde. Dos 26.001 postos de saúde que tiveram recursos aprovados para obras de melhorias, pelo menos 13 mil estão em curso e 7.520 foram concluídas.

Em entrevistas à RBA, o presidente do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), Antonio Carlos Nardi, sempre reiterou seu apoio. E em depoimento recente, pouco antes das eleições, avaliou o governo Dilma justamente pelo programa que se tornou seu carro-chefe na saúde e as ações a ele associadas.

“Não podemos descartar no governo Dilma a reforma das unidades básicas de saúde e a sua adequação para ofertar medicina, odontologia, assistência social e psicologia. As unidades, muitas vezes, não passavam de puxadinhos, por culpa do próprio sistema, que levou para os municípios uma demanda por ampliar o atendimento, sem a reestruturação das unidades. As prefeituras foram ampliando como dava: alugando casas e superlotando UBSs (Unidades Básicas de Saúde), que eram caixinhas de fósforos.”

Os prefeitos, claro, também apoiam, tanto que a Frente Nacional de Prefeitos defende que o programa tenha duração de seis anos, o dobro do período inicial, se possível com a continuidade dos mesmos profissionais.

Um programa de tamanha envergadura, porém, necessita de ajustes, como bem apontou a Sociedade Brasileira de Medicina da Família e Comunidade que combina apoio e críticas construtivas ao programa.

Entre as correções propostas pela entidade estão medidas para levar e fixar mais profissionais no interior do país. Como lembrou seu presidente, Thiago Trindade, professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, as regiões mais distantes ainda não conseguiram suprir plenamente a falta de médicos, como já foi possível nas periferias dos grandes centros e regiões metropolitanas. A saída, segundo ele, talvez seja uma política salarial, em vez das bolsas.

HPV

Outro destaque do governo Dilma, que terá forte impacto na saúde da população e nas finanças do SUS, é a inclusão no calendário oficial das vacinas contra HPV, para todas as meninas de 9 a 13 anos, conforme defendiam especialistas como medida para evitar casos de câncer de colo de útero, o terceiro mais frequente entre as brasileiras. A presidenta acertou também ao passar a vacinar as crianças de 1 e 2 anos contra a hepatite A, aperfeiçoando um programa de imunização que é modelo internacional.

Especialistas ainda destacam o incremento nos sistemas de transplantes nos últimos quatro anos, que colocaram o Brasil, por meio do SUS, como o maior transplantador do mundo, e investimentos nas unidades de pronto-atendimento e na rede de alta complexidade em oncologia, principalmente na região Norte do país, onde não havia centros de oncologia, equipados com serviço de radioterapia.

Dilma foi firme também ao atender aos movimentos de saúde e vetar parcialmente o chamado Ato Médico – o que explica em parte a fúria das entidades médicas contra a presidenta. A polêmica Lei 12.842, que regulamenta o exercício da carreira médica no Brasil, queria restringir aos médicos prerrogativas que eram compartilhadas por outros profissionais de saúde, como a prescrição e acompanhamento do uso de próteses, calçados ortopédicos, andadores e próteses auditivas, por exemplo.

Em julho do ano passado, ao receber a lei, ela vetou esse dispositivo e também aquele que dava exclusividade aos médicos na direção e chefia de serviços médicos. A partir da sua canetada, outros profissionais da saúde, também graduados em nível superior, podem, por exemplo, realizar exames citopatológicos e emitir seus laudos; coletar material biológico para análise em laboratório.

Sem mais recursos

Porém, faltou a Dilma coragem para enfrentar dois pontos que convergem para o principal problema do SUS: o subfinanciamento. O primeiro deles é a redução dos investimentos federais na conta da saúde. E o segundo, o avanço dos convênios particulares.

Para decepção dos defensores da saúde pública, a presidenta falhou ao não determinar o percentual de contribuição da União na regulamentação da Emenda 29, conforme tinha prometido em sua primeira campanha presidencial, e em nada se empenhou para fazer andar no Congresso o projeto de lei de iniciativa popular do movimento Saúde + 10, que obriga a União a investir 10% das receitas brutas no custeio do SUS. Trata-se de um projeto de lei fruto de mais de 2,5 milhões de assinaturas.

De acordo com a Constituição Federal, a partir da regulamentação da emenda 29, a responsabilidade pelo financiamento da saúde deve ser compartilhada pelos entes federativos. Estados devem investir. Existem inclusive regras estabelecidas em lei para vinculação de recursos próprios das três esferas de governo. Estados devem aplicar, no mínimo, 12%, municípios, mínimo de 15%, e a União não tem percentual fixo. Deve aplicar o montante do ano anterior corrigido conforme a variação do PIB.

Dados da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, vinculada à Fiocruz, indicam que o governo federal reduziu seus investimentos. Respondia por quase 70% do orçamento no início dos anos 1990 e hoje não passa de 44,7%. A redução pode ser explicada em parte pela descentralização e definição de regras mais rígidas de vinculação de receitas das esferas estaduais e municipais para a saúde a partir de 2000. Mas o fato é que os municípios estão estrangulados e muitos chegam a colocar quase o dobro do que manda a Constituição.

E os planos de saúde particulares seguem avançando. De olho na classe média emergente, seduzida pelas promessas de melhor atendimento, oferecem opções baratas com cobertura pífia. Atendimentos mais especializados, sem contar procedimentos complexos, como cirurgias, transplantes e outros, acabam sendo feitos pelo SUS que perde recursos também pelos benefícios e incentivos fiscais que o governo concede aos planos privados.

A presidenta ainda recuou diante da pressão de setores conservadores, o que levou a retrocessos que podem custar caro ao governo. Aborto e prevenção à aids, que envolve campanhas mais incisivas voltadas aos homossexuais, por exemplo, estão por trás de milhares de mortes.
Fonte: Rede Brasil Atual

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