Vagas ociosas desafiam cinco universidades federais em Minas
Com a saída de alunos para outras instituições, universidades públicas ficam com postos vazios, mesmo em cursos disputados. Na UFV, cadeiras inativas em medicina chegam a 25%
Márcia Maria Cruz /Estado de Minas
As causas vão desde o aumento na mobilidade dos estudantes – tanto internamente quanto entre universidades –, devido à implementação do Sistema de Seleção Unificada (Sisu), passam pelo desinteresse dos estudantes nas áreas escolhidas e vão até a abertura de cursos pelo Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni) sem um estudo adequado das demandas. O Estado de Minas identificou ociosidade de vagas Universidade Federal de Viçosa (UFV), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), Universidade Federal de Itajubá e na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).
Desde que o curso de medicina foi implantado na UFV, em 2010, a média é de 25% de vagas ociosas a cada turma, que tem entrada anual. Na avaliação do pró-reitor de Ensino, Frederico Passos, essa é uma realidade que as instituições do interior tem lidado desde quando a UFMG passou a usar o Sisu como porta de entrada dos estudantes. Na UFV são ofertadas 50 vagas no início do ano. “Não é uma questão só de Viçosa, as universidades federais de Minas lidam com essa questão. A mobilidade não tem uma causa única. É difícil avaliar esse impacto, pois ainda temos pouco tempo de Sisu.” A UFJF enfrenta o mesmo problema com a turma de 2015 de medicina. Entraram 90 estudantes, mas 15 mudaram de instituição, o que fará com que haja a necessidade de abertura de edital para o preenchimento dessas vagas.
Natural de Itabuna, na Bahia, o estudante Jonathas Blohem Souza, de 20 anos, se mudou para Juiz de Fora para cursar medicina. E agora deixa a UFJF para iniciar o curso em Belo Horizonte, na UFMG. Para ele, o Sisu cria distorções que deveriam ser evitadas. “Muita gente quer fazer medicina. Quem tem a nota muito alta passa em várias. Alguém que merecia passar não consegue por causa de uma falha do sistema. O governo investe muito no curso de medicina e temos muitas vagas perdidas. Certamente na UFJF teremos carteiras vazias neste semestre”, diz.
O jovem foi aprovado em sete universidades: as federais de Minas, Amapá, Sergipe, Rondônia e Juiz de Fora. Também passou em uma faculdade particular, em Alfenas (Sul do estado), e na Universidade Estadual de Pernambuco. Como a nota do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) não foi suficiente para a primeira entrada na UFMG, Jonathas começou o curso em Juiz de Fora. “A estrutura de UFJF é muito boa. Aconselho todos a estudarem lá, mas a UFMG é uma das universidades mais importantes do país e da América Latina”, pondera. Depois de um semestre em Juiz de Fora, o jovem desembarcou esta semana com os pais em BH. “Milhares de pessoas dariam qualquer coisa para estar naquele lugar”, diz ele, se referindo à UFJF. “O sistema é muito errado e poderia ser melhorado com uma medida simples”, avalia.
PROCESSO LENTO
O pró-reitor de Ensino da UFV ressalta que não é possível ocupar essas vagas rapidamente. Assim como ocorreu com Jonathas, muitos estudantes optam pelo curso de medicina na primeira entrada nas universidades do interior. Como a UFMG oferece duas entradas, muitos preferem trocar. Como é possível usar a mesma nota do Enem do ano anterior, eles tentam vaga no segundo semestre. “Isso poderia ser resolvido se as inscrições da primeira e segunda entrada fossem anunciadas no início do ano. Já foi feito dessa forma”, avalia Frederico Passos.
Metas do Reuni influenciam
A abertura e ampliação de cursos em decorrência do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni) sem um estudo prévio da demanda também é um dos fatores que levam à ociosidade de vagas. O pró-reitor adjunto de Graduação da Universidade Federal de Itajubá, Thiago Clé de Oliveira, chama atenção para o fato de as universidades terem aberto os cursos a partir de um processo de indução do Ministério de Educação (MEC). “Tínhamos a obrigação de cumprir algumas metas do Reuni. Foram novos cursos, prédios, laboratórios. Pediram para ampliar, agora vem essa crise e não temos recurso”, queixou-se. O contrassenso é que a estrutura aumentou, os recursos estão escassos e, em alguns casos, sobram vagas.
Na Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), 10% do total de vagas estão ociosas em decorrência do Reuni. “Estamos tentando reduzir a quantidade vagas ociosas. Com o Reuni, a universidade dobrou de tamanho”, afirma o pró-reitor de Graduação, Marcílio Sousa da Rocha Freitas. O sistema de entrada na universidade, por meio de três áreas do conhecimento, também contribui para a maior mobilidade de estudantes. Os cursos de graduação se estruturam nas áreas de ciências exatas e tecnológicas, ciências humanas e sociais aplicadas e ciências da vida. Os alunos relatam que é comum os estudantes entrarem em um curso com nota de corte menor e depois tentarem transferência para cursos mais concorridos. A reportagem conversou com estudantes na Ufop que usaram essa estratégia para mudar do curso de turismo para direito, e de engenharia de produção para arquitetura. Eles pediram para não serem identificados.
REGRAS ALTERADAS Como os cursos estão na mesma área, os estudantes entram no turismo e depois pedem transferência para o direito. Para evitar essa mudança, que causava ociosidade em alguns cursos, as regras para a transferência foram alteradas na Ufop. Antes as vagas eram prioritariamente ofertadas internamente e depois abria-se a concorrência para a comunidade externa. A partir desse semestre, cada curso poderá estabelecer as regras de como essas cadeiras serão compostas e o percentual destinado para alunos internos ou para pessoas externas à universidade. Será um edital único. “O aluno percebe que não é o curso que quer e, com o Sisu, tem possibilidade de mudar de curso e faculdade. O lado positivo é que pode corrigir escolha que possa ter feito errado. Se ele percebe que não é a escolha adequada, ele muda.”
Na UFMG, os números da mobilidade com a implementação do Sisu são bastante expressivos. No primeiro semestre de 2011, quando o Enem substituía a primeira etapa das provas, apenas 0,4% dos estudantes mudaram de curso ou de instituição. O índice passou para 12,15% em 2014. Metade das trocas de cursos ocorreu dentro da própria instituição, e a outra metade para escolas federais do interior ou de outro estado. A universidade também passou a receber um número maior de alunos. Cerca de 25% que ingressaram na universidade de 2014 já estavam matriculados em cursos superiores – dentro da própria UFMG ou oriundos de outras faculdades. (MMC)
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